Brasil na Vanguarda da Descarbonização na Indústria de Mineração

A descarbonização global enfrenta desafios multifacetados, tais como a dependência contínua de combustíveis fósseis, a infraestrutura existente baseada nesses recursos, obstáculos econômicos de curto prazo e dificuldades em setores de alto carbono, como é o caso do setor minerário. Além disso, existe o desafio de atingir uma demanda por tecnologias limpas avançadas.

Nessa perspectiva, a empresa Accenture conduziu um relatório de pesquisa sobre a liderança do Brasil na descarbonização do setor mineral e destaca a trajetória das empresas mineradoras em direção à neutralidade de emissões.

A seguir, apresentamos um resumo abrangente elaborado pelos especialistas da Accenture. Boa leitura!

Atualmente, o Brasil se destaca com 85% de sua energia elétrica originando-se de fontes renováveis, um valor três vezes superior à média mundial de 27%¹. Além disso, há perspectivas de novos incrementos nesse índice nos próximos anos.

Isso coloca os desafios e oportunidades da descarbonização no Brasil em um cenário diferente em comparação com os desafios globais. Um fator adicional favorável é a menor complexidade geopolítica no que diz respeito ao fornecimento de energia no país.

Consequentemente, as iniciativas de descarbonização no Brasil se distinguem das iniciativas globais, que têm como foco principal a redução ou eliminação das fontes de energia baseadas em combustíveis fósseis ou carvão. As mineradoras brasileiras concentram seus esforços em alcançar uma maior eficiência energética em suas operações.

Quando se trata de sua pegada de emissões de carbono, a indústria de mineração exerce uma influência significativa, contribuindo com 29% das emissões entre os processos industriais e representando 1,3% das emissões totais do Brasil (conforme ilustrado na Figura 1).

Esse cenário favorece a posição de liderança e impacto das mineradoras brasileiras na busca por iniciativas inovadoras para promover a descarbonização e atingir as metas de neutralidade de emissões a partir de 2030.

Figura 1: Estimativa de emissões de GEE no Brasil por setor e participação da cadeia de produção mineral em 2020 (milhões de tCO2e)
Potencial competitivo e preparação para novos requerimentos de mercado

Com a provável aprovação do Mecanismo de Ajuste de Fronteira de Carbono (CBAM) pela União Europeia, que implicará em tributação com base nas emissões de gases de efeito estufa (GEE) na produção de mercadorias importadas, o Brasil se depara com a perspectiva de novos requisitos de mercado.

O país, detentor de vastas reservas minerais e uma posição de destaque na produção e exportação desses recursos, tem uma forte motivação para se adequar às exigências presentes e futuras desse mercado.

Além disso, a matriz energética brasileira predominantemente renovável confere uma vantagem competitiva, colocando o país à frente na busca por mineração mais sustentável.

Essas condições tornam o Brasil altamente atraente para investimentos e uma potencial liderança no processo de descarbonização global. Aponta os especialistas.

Como as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) são classificadas na mineração?

As GEE na indústria de mineração são classificadas em três escopos distintos:

Escopo 1 (Emissões diretas):

  • Emissões provenientes da extração de combustível fóssil.
  • Emissões geradas pela geração de energia utilizada nas operações de mineração.
  • Emissões resultantes da produção da matéria-prima da mineração.
  • Emissões das instalações e edifícios de propriedade da empresa.
  • Emissões de veículos e equipamentos operacionais.

Escopo 2 (Emissões indiretas):

  • Emissões relacionadas à aquisição e consumo de energia para operações.
  • Emissões da geração de energia usada nas operações.

Escopo 3 (Demais emissões indiretas):

  • Emissões indiretas provenientes de fontes controladas nas operações.
  • Emissões da destinação final e tratamento de produtos vendidos.
  • Emissões do transporte e distribuição de produtos da mineração (tanto downstream quanto upstream).
  • Emissões geradas pelo deslocamento de funcionários e viagens de negócios.
  • Emissões associadas ao processamento e uso de produtos minerais.
  • Emissões de subsidiárias e ativos alugados.
    Emissões resultantes do transporte de matéria-prima dos pontos de produção (minas) até o terminal marítimo por meio de ferrovias.

Essa classificação abrangente dos escopos de emissões na mineração destaca a importância de avaliar não apenas as emissões diretas, mas também as indiretas ao longo de toda a cadeia de valor da indústria.

Insights da pesquisa com investidores

A pesquisa com investidores revela que, embora os critérios financeiros continuem sendo de maior importância, como o aprimoramento do desempenho financeiro e a solidez do balanço patrimonial, classificados como “importante” e “muito importante” por 83,5% e 83,0% dos entrevistados, respectivamente (Figura 2), os critérios relacionados à descarbonização estão ganhando crescente relevância na alocação de capital pelos investidores.

Inovação, preocupações com passivos ambientais potenciais e um compromisso sólido com a descarbonização são considerados “importantes” e “muito importantes” por 74%, 71% e 70% dos entrevistados, respectivamente.

Figura 2: Importância dos critérios na condução da alocação de capital

Essa interpretação indica que os investidores estão pressionando as empresas de mineração a adotar abordagens agressivas em direção à descarbonização e, ao mesmo tempo, a entregar resultados financeiros sólidos, seja por meio do aumento da receita ou da redução do custo de capital.

No que se refere às iniciativas de sustentabilidade, as emissões de Escopo 3, que são geradas pelos compradores dos produtos da mineração, destacam-se como o fator de avaliação mais relevante para os investidores (Figura 3).

Figura 3: Atributos que gerariam um prêmio significativo no valor para os investidores

Além disso, quando questionados sobre a importância relativa das emissões de Escopo 1, Escopo 2 e Escopo 3, a pesquisa revela que as emissões de Escopo 3 são valorizadas em mais de três vezes em relação às emissões de Escopo 1 e 2, mesmo quando essas emissões podem não ser substanciais (Figura 4).

Figura 4: Importância das categorias de emissões para os investidores

Esse cenário sublinha a importância crescente da cadeia de suprimentos e da responsabilidade estendida nas estratégias de sustentabilidade e descarbonização das mineradoras, refletindo a necessidade de considerar não apenas as emissões diretas, mas também as indiretas ao longo de toda a cadeia de valor.

Iniciativas de descarbonização que impulsionam o valor para os acionistas

A incorporação de tecnologias avançadas, como análise de dados, inteligência artificial (IA) e blockchain, tem o potencial de aprimorar a eficiência operacional nas operações de mineração, resultando em aumento de receitas e lucros. É fundamental destacar que essas tecnologias desempenharão um papel central na consecução e no monitoramento do desempenho da descarbonização.

Como resultado, é plausível esperar que projetos de transformação digital sejam bem recebidos não apenas pelos investidores, mas também por outros stakeholders envolvidos.

Conforme observado anteriormente, o estudo aponta que os investidores consideram as tecnologias emergentes e a transformação digital como as melhores oportunidades para aprimorar o valor das empresas mineradoras.

O estudo indica que os investidores veem as tecnologias emergentes e a transformação digital como as melhores oportunidades para melhorar o valor das mineradoras.

Assim, ao embarcar na jornada em direção às metas de emissão líquida zero, três estratégias fundamentais orientam a implementação das iniciativas:

  1. otimização das operações (melhorias na eficiência visando à redução do consumo de energia);
  2. eletrificação do consumo (substituição de combustíveis fósseis e adoção de veículos elétricos) e;
  3. descarbonização (consumo de energia gerado exclusivamente por tecnologias de baixa emissão de carbono).

Essas abordagens representam os pilares para a redução das emissões de carbono na indústria de mineração e o aumento da sustentabilidade, o que, por sua vez, é percebido como um catalisador do valor para os acionistas.

Entre as soluções com benefícios limitados, os especialistas destacam-se a venda de ativos relacionados ao carvão e a implementação de tecnologias de captura, utilização e armazenamento de carbono (CCUS).

No entanto, independentemente da estratégia escolhida, a transformação digital desempenha um papel crucial. Soluções net-zero apoiadas por tecnologias digitais podem oferecer maneiras economicamente viáveis de alcançar reduções de emissões em todos os setores.

Um exemplo disso pode ser observado na Europa, onde pesquisas recentes da Accenture revelam que a busca por oportunidades estratégicas a curto prazo e em um horizonte próximo permitirá que as empresas europeias não apenas estejam bem posicionadas para atingir a ambiciosa meta de 55% de redução de emissões até 2030, mas também desbloqueiem aproximadamente € 28 bilhões em valor de negócios em seis setores específicos, incluindo produtos químicos, cimento, ferro e aço, baterias, produtos farmacêuticos e data centers, até 2025.

Isso demonstra o potencial de integração de tecnologias digitais para impulsionar resultados positivos tanto do ponto de vista ambiental quanto econômico.

E como as mineradoras brasileiras devem proceder?

Segundo a Accenture, a abordagem mais sensata envolve o desenvolvimento de iniciativas de curto prazo que proporcionem resultados rápidos, a fim de estabelecer confiança junto aos investidores, antes de enfrentar os desafios mais amplos da descarbonização, que, embora possam ter impacto significativo, também carregam consigo riscos elevados.

Além disso, como destacado no estudo “Measuring sustainability. Creating value,” é de importância crítica que as empresas mineradoras continuem investindo em tecnologias que aumentem a transparência em relação às suas emissões e fortaleçam sua capacidade de gestão sobre elas.

Essa abordagem não apenas contribui para a sustentabilidade, mas também fortalece a confiança dos investidores e a resiliência das empresas diante dos desafios da descarbonização.

Considerações finais

Os resultados analisados pelo relatório, indicam que aprimorar um produto de minério de ferro com teor relativamente baixo de 58% em apenas 0,5% a mais de ferro (Fe) poderia resultar em uma redução de aproximadamente 0,75% nas emissões das siderúrgicas na fase downstream por unidade de metal quente ou aço produzido.

Considerando que as emissões do Escopo 3 na fase downstream para produtos de minério de ferro de baixo teor podem exceder em mais de 100 vezes as emissões dos Escopos 1 e 2 da mineradora, essa redução modesta, mas significativa, pode representar mais do que a soma das emissões diretas dos Escopos 1 e 2 produzidas pela própria mineradora.

Além disso, considerando que produtos de alta qualidade já possuem preços premium, a precificação do carbono apresenta a oportunidade de aumentar ainda mais esse prêmio, pois os compradores buscam evitar taxas de carbono e outras penalidades.

No exemplo mencionado anteriormente, onde um produto de minério de ferro com 58% (Fe) é aprimorado para 58,5% (Fe), o diferencial de preço premium pode aumentar em mais de US$ 1 por tonelada (de US$ 5 por tonelada para US$ 6 por tonelada – um prêmio de 20%) se as siderúrgicas estiverem sujeitas a um preço de carbono de US$ 100 por tonelada.

Essencial para capturar esses prêmios de preço é a implementação de um rastreamento de carbono preciso e auditável que começa na mina e se estende por toda a cadeia de valor na fase downstream.

À medida que mais empresas de mineração adotam essas práticas, podemos antecipar um futuro onde os preços de metais e minerais serão determinados com base em sua pegada de carbono global ou em uma pontuação de sustentabilidade.

Por exemplo, com base em um preço de carbono de US$ 100 por tonelada, um produtor de aço pode estar disposto a pagar um prêmio de US$ 3 por tonelada por minério de ferro de 58% (Fe) com emissões zero de carbono, ou um prêmio de US$ 3,16 por tonelada por minério de ferro “verde” de 66% (Fe).

No entanto, isso depende inteiramente da motivação do comprador para adquirir esses produtos provenientes de operações ambientalmente sustentáveis, o que pode resultar em taxas de carbono ou pressões do consumidor final.

O avanço nessa direção pode transformar a maneira como os preços de metais e minerais são determinados, levando em consideração não apenas a qualidade do produto, mas também o seu impacto ambiental.

Com base nas análises realizadas no estudo, os investidores identificam as maiores oportunidades quando as mineradoras priorizam tecnologia, transformação digital e iniciativas de eficiência que podem:

  • Reduzir todas as emissões, abrangendo os Escopos 1, 2 e 3.
  • Melhorar os resultados financeiros das empresas.
  • Facilitar a medição e o rastreamento confiável das emissões de carbono.
  • Possibilitar a monetização do sucesso das ações de descarbonização em toda a cadeia de valor.

Além disso, essas iniciativas estabelecem as bases para que as mineradoras aproveitem sua engenhosidade humana na abordagem dos desafios mais significativos relacionados à descarbonização que têm pela frente.

O resultado não se limita a impulsionar a sustentabilidade ambiental, mas também representa uma fonte de sustentabilidade financeira e de avaliação a longo prazo.

Em outras palavras, a adoção de tecnologias avançadas, a melhoria da eficiência e a ênfase na descarbonização não apenas contribuem para a redução do impacto ambiental, mas também fortalecem a saúde financeira das empresas e sua avaliação de longo prazo, proporcionando um benefício duplo que atende aos interesses dos investidores e à sustentabilidade global. Conclui a Accenture.

Sobre o Estudo

Este estudo é baseado na Pesquisa Global de Investidores Institucionais da Accenture sobre ESG em Mineração, que entrevistou tomadores de decisão em 200 empresas de investimento institucionais públicas e privadas com ativos de mineração em seu portfólio avaliados em aproximadamente US$ 847 bilhões em junho de 2021.

As empresas estavam sediadas principalmente na Austrália, Canadá, Hong Kong, Nova Zelândia, Singapura, África do Sul, Reino Unido e Estados Unidos. O objetivo foi entender o impacto dos fatores ambientais, sociais e de governança (ESG) nas decisões de investimento.

A pesquisa global foi realizada em 2021, antes da invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro de 2022. Existe o risco de que o sentimento dos investidores em relação às iniciativas ESG possa ter mudado como resultado da invasão, no entanto, ainda acreditamos que os resultados da pesquisa refletem com precisão as opiniões dos investidores.

Referências

Os dados apresentados neste relatório são provenientes da Pesquisa Global de Investidores Institucionais da Accenture sobre ESG em Mineração, a menos que indicado de outra forma. Abaixo, estão as referências específicas:

  1. “Matriz Energética e Elétrica”, Empresa de Pesquisa Energética, 2021.
  2. Peter Lacy e Jessica Long, “UNGC – Accenture Strategy CEO Study on Sustainability”, Accenture, 2019.
  3. Taylor Kuykendall, “Path to net-zero: Seeing climate opportunity, miners target emissions cuts”, S&P Global Market Intelligence.
  4. Relatório sobre Mudanças Climáticas 2021, Vale, 2021.
  5. “CSN vai testar tecnologia à base de hidrogênio verde”, Valor, 2022.
  6. Hannah Ritchie e Max Roser, “Emissions by Sector”, Our World in Data.
  7. Jean-Marc Ollagnier, Sytze Dijkstra e Lasse Kari, “European industries can grow with green”, Accenture.
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